DUQUESA DE ALBA, GOYA E TINA TURNER: relações prováveis

A tela, juntamente com a sua companheira, A Maja Vestida, foi muito provavelmente concebida para fazer par com aquela: ambas montadas numa moldura dupla, a tela com a moça vestida devia cobrir a nua como se fosse uma tampa que podia ser levantada. Sobre o otomana de veludo verde, a maja, deitada numa simples diagonal sobre as almofadas de seda e o lençol bordado, proporciona uma das imagens mais famosas de beleza feminina, triunfal exaltação e celebração da vida. Nela se surpreende a franqueza do nu: a protagonista exibe-se sem o menor recato, com os braços para cima, por detrás da cabeça, enquanto olha diretamente o espectador e, para ressaltar a ausência de qualquer intenção alegórica, não esconde o púbis, até então ausente da pintura. A beleza aqui não é um cânone abstrato e ideal, mas uma apaixonada participante: o corpo resplandecente vive no abraço da luz, protagonista móvel que cria no ambiente concavidades de sombras secretas, deslumbra e roça, desliza sobre as brancas carnes e sobre os tecidos, propaga-se e reaparece com palpitações e suspiros. Esta criação inspira-se, sem dúvida, nos célebres nus de Ticiano e de Velázquez, mas estabelece o novo modelo de sensibilidade e visão exclusiva do artista, sem pretextos nem reparos, e talvez por isso foi tão apreciada pelos artistas do século XIX, em primeiro lugar por Edouard Manet (veja-se a Olympia do Museu d'Orsay, em Paris).

A Maja Desnuda, Francisco Goya, 1795. Óleo sobre tela, 98 x 191 cm.  Museu do Prado
Continuam as discussões sobre a identidade da modelo, que por muito tempo se julgou ser a duquesa de Alba, outra hipótese é Pepita Tudó, amante e mais tarde, esposa do poderoso ministro Godoy, como também, sobre o significado do duplo retrato, vestido e nu, com a mesma protagonista e sobre a cronologia (a Vestida é, certamente, posterior, de 1800-1806). O vestido, assim como a jaqueta de toureiro, a faixa ajustada e os escarpins de seda, com bordados a ouro e ponta pronunciada, revelam a alta linhagem da modelo: tratar-se-ia, por conseguinte, de uma espécie de máscara: uma dama diverte-se fazendo-se passar por plebeia, mostrando-se numa atitude despreocupada e provocadora, livre de quaisquer convenções formais. A moça decalca a imagem da tela da Desnuda tanto na diagonal como na posição dos braços, mas são notáveis as diferenças de tom e de riqueza cromática.  Neste caso escolheu-se um momento mais crepuscular, com ientesas luzes e sombras, e o corpo destaca-se no esplendor da roupa branca, que, atingida em cheio pela luz, se afunda entre as pernas; na aparente identidade, a pose é mais descontraída e apoia-se nas barrigas das pernas, que sobressaem do divã.  O pincel de Goya mostra a densidade, a riqueza e a qualidade líquida do empaste da matéria, estendido com pinceladas livres que perseguem as aventuras da luz sobre cada superfície. 
A Maja Vestida, Francisco Goya, 1800. Óleo sobre tela, 95 x 190 cm. Museu do Prado
A possível relação amorosa entre María del Pilar Cayetana de Silva Alvarez de Toledo, XIII - duquesa de Alba, primeira dama de relevância na corte, e o pintor da corte Francisco Goya y Lucientes, tem sido motivo de grandes debates entre os historiadores. Neste sentido, este retrato pode ser entendido como uma prova dessa relação, ou pelo menos, do interesse romântico do artista pela dama. Neste retrato, a Duquesa exibe na sua mão direita dois anéis, um deles leva a inscrição, Alba, em representação da sua linhagem familiar, enquanto no dedo indicador - com letras claras - Goya.  Como se não bastasse esta mostra de ligação entre o artista e sua modelo, a Duquesa assinala com este mesmo dedo a areia sob seus pés onde se lê  "Solo Goya".

(...)A cena foi pintada supostamente durante uma viagem dos amantes a Andaluzia logo depois da morte do Duque e acredita-se que a paisagem ao fundo representa a planura de Salúcar - onde a família da Duquesa possuía grandes propriedades. A palavra "Solo" escrita sobre a areia, só foi revelada recentemente a partir de uma restauração; a inscrição encontrava-se oculta até então sob várias camadas de pintura adicionadas em anos posteriores a sua realização.

Portrait of the Duchess of Alba, Francisco Goya, 1797. Óleo sobre tela, 120 x 149 cm, Hispanic Society of America
Bibliografia/Referências
Rose-Marie e Rainer, Hagen: Los secretos de las obras de arte: Del tapiz de Bayeux  a los Murales de Diego Rivera. Tomo II, Singapura: TASCHEN, 2005. P. 532.
Tarabra, Daniela. Museu do Prado, Madrid. Rio de Janeiro : Mediafashion, 2009. P. 104:108 (Coleção Folha grandes museus do nundo; v.1)
Disponível em Museu do Prado 
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Preciosidade, filme que merece ser visto.  Se não for pela arte, pelo contexto histórico.




Sinopse O camponês Francisco de Goya torna-se um pintor famoso sob a influência da duquesa de Alba. O século XVIII é uma época de intrigas na corte espanhola. A duquesa de Alba, um monarquista ardente, começou um caso escandaloso com o célebre pintor da corte, Francisco de Goya. Enquanto isso, agentes do rei planejavam trair a nação, facilitando a entrada das tropas de Napoleão ... Este filme é um épico de amor, traição e triunfo artístico, ambientado na revolução espanhola, marcada pelo caos social. Uma obra prima remasterizada com dublagem em português. Indispensável.


Goya foi um pintor intenso... Sua vasta obra - permeada de genialidade - nos transporta para o horror da guerra - a invasão napoleônica - como nos expõe seus mais íntimos sentimentos. Sua obra é uma confissão pessoal: fiel e franca.  Na obra O Retrato da Duquesa de Alba, apontando enfaticamente para sua inscrição "Solo Goya" quase posso ouvi-la:

"Você é simplesmente o melhor, 
Melhor do que todo o resto
Melhor do que qualquer um, 
Qualquer um que eu tenha conhecido."


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